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terça-feira, 8 de novembro de 2016

O impressionante relato de um professor da UFC




Carta enviada ao blog por um professor (mestre e doutor) que ensina na UFC há mais de uma década.

Em princípio, gostaria que preservasse o meu nome assim como os meus detalhes acadêmicos. Pelo que presenciei na última assembléia dos professores, sexta passada, temo por minha integridade física se o movimento dos estudantes souber a origem dos comentários abaixo.

Nunca me senti tão desrespeitado como na Assembléia de sexta passada, dos professores da UFC. Segunda e terça passadas os professores decidiram, em plebiscito, não aprovar a greve por tempo indeterminado contra a PEC 241, proposta emanada da ADUFC. Então, descontentes com essa decisão, os alunos realizaram uma assembléia na Concha Acústica terça passada e, com o apoio de certos segmentos docentes, deflagraram uma greve deles mesmos.

Entrementes, a assembléia de sexta passada tinha por objetivo homologar o resultado do plebiscito (que apontou o desejo da maioria!). Ocorre que cerca de pelo menos 200 estudantes apareceram no auditório onde a assembléia se realizaria, para apoiar os professores que estavam a favor da greve, postando-se nas filas centrais e nos corredores laterais e praticamente impedindo a passagem de outrem. Gritavam “palavras de ordem” e cânticos para, nitidamente, constranger os presentes a, não homologando o resultado do plebiscito, dar um golpe no desejo da maioria dos 913 professores que não desejam greve (contra 666 que a desejam).

Vale frisar que muitos desses estudantes presentes à assembléia (assim como alguns dos professores que os apoiavam) pareciam mais militantes de movimentos organizados ou partidos de extrema esquerda do que estudantes e professores.

Os estudantes hostilizavam os professores que não compartilhavam de suas opiniões e que votaram contra a greve. Fomos chamados de “bois”, sob o som da música “Vida de Gado”, de Zé Ramalho”, e cada um de nossos 145 votos (aqueles ratificando o resultado do plebiscito) foram contados pelo presidente da ADUFC tendo o coro “vergonha” ao fundo. A votação final foi 145 a 85 pela ratificação.

A certa altura, um colega professor pediu a palavra e comentou que “não era por ser contra a greve que era a favor do governo”, e prosseguiu criticando a greve dos estudantes e a ostensividade das manifestações que eles faziam no momento. Por conta disso, algum tempo depois desentendeu-se com outra colega, esta uma professora negra da Faculdade de Educação e apoiadora dos estudantes, ao que estes retrucaram entoando um coro de “racista” completamente despropositado contra ele (uma vez que, nitidamente, não houve qualquer injúria racial). O ar de perplexidade do professor era flagrante, e me chocou.

Bom, mas exceto por essas lástimas deploráveis, não vi nenhuma, uma só que fosse, objeção séria à PEC 241. Em verdade, para além dos chavões “Fora Temer”, “PEC da Morte”, “vinte anos de arrocho” e similares, e das musiquinhas e frases de efeito muito bem ensaiadas do coro dos estudantes, a única coisa que chamou minha atenção (e essa doeu!!) foi constatar a hipocrisia com que estudantes e professores apoiadores da greve desrespeitaram seus mestres e colegas, tanto enquanto cidadãos portadores de livre-arbítrio quanto como professores da UFC. Engraçado eles se dizerem preocupados com a Educação, quando não conseguem respeitar seus professores…

Estou somente na meia-idade, mas sou de um tempo em que professores universitários eram respeitados, e o flagrante desrespeito generalizado que presenciei foi aviltante. O que realmente vi do lado deles foi truculência e uma noção bem particular de democracia, na qual só o sujeito concorda com opiniões consoantes às suas.

Pra piorar, foi chocante ver a Diretoria da ADUFC assistir os professores contra a greve serem achincalhados e nada fazer. Pior ainda: a ADUFC vai destinar (a pedido dos tais alunos manifestantes lá presentes) uma parte da cota sindical que nós, professores, pagamos, para sustentar os alunos grevistas em água e comida. Ora bolas! Eles que paguem sua água e comida! Não pago cota sindical pra isso. Decerto que a diretoria do sindicato dirá que essa decisão foi aprovada pelos presentes, mas, após a ratificação do plebiscito, a assembléia já se esvaziara completamente…

Também, a pedido de um dos professores apoiadores da greve, essa tal assembléia esvaziada, cedendo à esquizofrenia geral, aprovou uma moção de apoio ao MST!! Afora o fato de que eu, se pudesse, colocaria esse grupo na clandestinidade, não vejo relação alguma dele com os problemas da universidade. O que vejo é um aparelhamento lastimável da universidade por partidos de esquerda e militantes desses tais “movimentos sociais”.

Eu e vários colegas, de vários departamentos, saímos péssimos da assembléia, tendo cancelado nossas aulas da tarde por falta de condições psicológicas. Peguei-me pensando seriamente que, após 10 anos de formação (graduação, mestrado e doutorado), mais quase 13 anos como professor, passei a não me ver mais como parte daquilo em que a universidade transformou-se.

Bem, peço desculpas pela mensagem longa e pelo tom de lamento. O que ocorreu na sexta realmente impactou a mim e a outros, ciosos de nossas liberdades de expressão e do pluralismo de ideias. Peço-lhe uma vez mais para não identificar-me. O departamento vizinho ao meu está invadido pelos estudantes…

Fábio Campos

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